sexta-feira, 18 de março de 2016

Recordando Coelho nas presidenciais de 2011

José Manuel Coelho frente ao Palácio de Belém, em Lisboa

José Manuel Coelho é, depois de Alberto João Jardim, o político madeirense mais conhecido dentro e fora da ilha nos últimos tempos. Têm por denominador comum a frontalidade e o populismo. Figuras do circo mediático da política regional, são as duas faces da mesma medalha, o jardinismo. De um lado Jardim, do outro, o anti-Jardim.
Não é por acaso que Coelho faz parte, com Jardim, dos cinco nomeados para a eleição de "Os Mais de 2010", por votação dos leitores do Diário de Notícias do Funchal, nas categorias de "Político" e de "Cromo do ano". Neste caso, a distinção recai sobre "aquele que nos fez rir ou chorar, que não nos sai da cabeça ou nos faz perder a cabeça".
Numa recente sondagem feita pelo semanário Tribuna da Madeira, publicada a 18 de Dezembro, Coelho, 58 anos, destacou-se como a figura pública que "teria mais hipóteses de derrotar Alberto João Jardim nas eleições regionais de 2011", com 28 por cento dos votos. À frente de um dos principais candidatos do Partido Social Democrata (PSD) à sucessão, o presidente da Câmara do Funchal, Miguel Albuquerque (17 por cento), dos líderes do maior partido da oposição, o Partido Socialista (PS), Jacinto Serrão (nove por cento), e do Partido Popular (CDS/PP) regional, José Manuel Rodrigues (oito por cento).
Coelho desvaloriza os resultados destes inquéritos online. "Não têm base científica, não são para levar a sério", diz ao P2. "Resultam do apoio da malta jovem que lida bem com os computadores e está descontente com a classe política." Para esses descontentes, como observa o empresário Miguel Freitas, "votar Coelho é mostrar um cartão vermelho" aos outros candidatos e partidos apoiantes. 
Isso pode explicar, em parte, a surpreendente adesão não só de jovens, mas de desempregados e idosos que subscreveram a propositura de Coelho a candidato à presidência. E também o facto de a sua entrevista à RTP ter ultrapassado, no número médio de telespectadores (889 mil), Cavaco Silva (869 mil), ficando em segundo depois de Fernando Nobre (908 mil).O madeirense foi aquele que, de entre todos os entrevistados, conseguiu a melhor fatia dos espectadores que nesse momento viam televisão (23,3 por cento).
Coelho está consciente de que o seu atrevimento, irreverência e humor não o vão levar a trocar a modesta casa em Gaula pelo Palácio de Belém. Aliás, não é esse o seu objectivo, nem dos impulsionadores da sua candidatura que, admitem, funciona como preparação para as eleições regionais previstas para Outubro próximo, o que provoca apreensão nos directórios dos outros partidos, a começar pelo que está no poder.
"[O PSD-Madeira] está assustado com o avolumar da adesão popular à minha candidatura e à nossa luta", diz Coelho. O candidato apoiado pelo Partido Nova Democracia (PND), de que é deputado único à Assembleia da Madeira, explica que este partido constitui "uma "barriga de aluguer" para receber democratas de vários partidos descontentes com o cenário político regional, com a própria inoperância dos partidos da oposição e que se juntaram num grupo heterogéneo com um único objectivo: combater o jardinismo e instaurar um regime democrático na Madeira, o 25 de Abril que nunca chegou". 
Baltazar Aguiar, líder do PND e cunhado do seu fundador, Manuel Monteiro(que já não está no partido), explica a estratégia: "Os partidos são palcos institucionais montados, [cujas] estruturas possibilitam a entrada de pessoas." A ideia de aproveitar esta sigla partiu de Aguiar, do também advogado António Fontes, do ecologista Gil Canha e de Eduardo Welsh, membro de uma das mais abastadas famílias inglesas radicadas na ilha, constituindo-se como os "quatro cavaleiros do apocalipse" madeirense. "Somos todos de direita e centro-direita, por isso procurámos alguém de esquerda que viesse equilibrar as coisas", diz Aguiar.
É aqui que, em 2007, entra um pintor da construção civil. "Estava na redacção do Garajau,quando entra um indivíduo desconhecido, com a camisa toda ensanguentada, a queixar-se da brutalidade de uma busca policial à sua casa. Procurou-nos, porque a imprensa regional não quis dar eco à sua queixa", conta Gil Canha, então director daquele mensário satírico de combate ao jardinismo. Era José Manuel Coelho, então alvo de investigação por suspeita de distribuir o panfleto periódico Democratas de Gaula, com denúncia de casos de alegadas corrupção e promiscuidade em Santa Cruz, município que teve um dos dois presidentes de câmara (Luís Gabriel), entre 11 existentes no arquipélago, condenados a pena de prisão efectiva por crimes de corrupção e peculato. 
Desde então Coelho e os três principais mentores do Garajau (Aguiar, Canha e Welsh) uniram-se, sob a bandeira do PND, com o objectivo de "podar o jardim" - slogan usado nas regionais antecipadas de Maio de 2007 - e contribuir para a alternância política na Madeira. Concorreram pela primeira vez nessas eleições, quando Jardim, a pretexto da entrada em vigor da nova lei que regulava com maior rigor o relacionamento financeiro entre o continente e a região, se demitiu. Com dois mil votos (2,08 por cento), menos de um terço dos subscritores da candidatura, Coelho tornou-se depois deputado regional, substituindo Baltazar Aguiar, que abandonou o Parlamento quando Jardim, em vésperas da visita oficial do Presidente da República à Madeira, chamou "bando de loucos" à oposição, cujos representantes Cavaco Silva recebeu no hotel, em breves audiências não incluídas no programa, de que não constou a tradicional sessão de boas-vindas na Assembleia Regional.
As cenas protagonizadas por Coelho nos três anos de actividade parlamentar (2007-2010) deram-lhe projecção nacional e regional. Depois de uma campanha eleitoral feita num carro funerário, usado para "sepultar a corrupção", tornou-se conhecido como o "deputado do relógio" ou da bandeira nazi, por ter exibido estes elementos em protesto contra a redução dos tempos de intervenção dos deputados oposicionistas no plenário ou contra o "regime ditatorial" na Madeira, situação que levou o PSD a expulsá-lo do Parlamento. Para repudiar o exagerado financiamento partidário na região feito sob forma de subvenção parlamentar, distribuiu aos idosos o dinheiro recebido pelo PND. Provocou também a ira dos sociais-democratas quando propôs uma caricatural estátua ao "grande líder Jardim" e quando telecomandou o "zeppelin" que foi abatido a tiro quando tentava sobrevoar a festa anual do PSD no Chão da Lagoa. E, numa comemoração do 25 de Abril, fez de Salgueiro Maia, no simulacro de ocupação da Quinta Vigia, residência oficial do presidente do governo regional, para reclamar "a liberdade e a democracia que tardam a chegar à Madeira".
Coelho diz que, se fosse deputado à Assembleia da República, não levaria a bandeira nazi e o relógio ao pescoço, porque "não se coloca o mesmo problema antidemocrático da Assembleia da Madeira". Pela mesma razão, utiliza na campanha realizada na ilha a "guerra subversiva" (que define como um conjunto de acções "espectaculares" para alertar as instituições nacionais para a situação antidemocrática) e, nas acções a realizar no continente, a "guerra convencional", para expor os propósitos da candidatura: "Denunciar e combater a corrupção, eliminar as regalias dos políticos e moralizar a justiça."
As críticas de Jardim
Na opinião de Alberto João Jardim nada disto é "histórico", representa "um fenómeno de pura e mera palhaçada política". Coelho, disse o governante no Parlamento regional em Dezembro, "é pago pela extrema-direita, principalmente por algumas famílias que foram poder na Madeira e que exploraram o povo madeirense e que agora lhe pagam para através da palhaçada denegrir o sistema de autonomia política, denegrir o regime democrático e fazer ataques pessoais".
Jaime Ramos, líder parlamentar do PSD, subscreve esta opinião sobre Coelho. "Está instrumentalizado por capitalistas que beneficiaram do sistema, antes do 25 de Abril, e continuam a beneficiar", explicou ao P2. "Diz que é comunista, agora está num partido de extrema-direita. É uma mistura curiosa. Só pode ser para gozar."
Eduardo Welsh, cujos bem familiares têm sido objecto de polémicas expropriações decretadas pelo governo regional, nega estar a financiar a campanha deCoelho. "Ficaria mal se não fizesse um donativo, mas antes tenho de pagar as custas judiciais de um processo que me foi movido pelo vice-presidente do governo [Cunha e Silva]." 
"Sempre fui e sou comunista", defende-se o deputado do PND. "Este é um partido de direita, mas daquela direita que é hostil ao poder, porque a direita do poder, a do grande capital financeiro, está personificada no PSD e no PS. Estou a aproveitar uma oportunidade para ajudar a democracia", diz Coelho.
Depois de Jardim, o líder parlamentar do PSD - Coelho chama-lhe "o nosso amigo Jaime Ramos" - e o seu filho Jaime Filipe são os alvos predilectos do agora candidato presidencial no Parlamento: "Eles representam a oligarquia do regime jardinista."
Coelho rejeita os epítetos de "palhaço" ou "Tiririca da política portuguesa" que habitualmente lhe aplicam comentadores e cidadãos anónimos. "Sou um homem sério, um lutador que não está refém de ideologias e, embora deputado, considero-me um pintor da construção civil", profissão que ultimamente só exerceu em regime de trabalho comunitário a que foi condenado num processo por difamação da juíza Joana Dias. Por prática de idêntico crime na pessoa do vice-presidente do governo e de autarcas do PSD, em julgamentos em que foi acusado pelo Ministério Público como distribuidor do panfleto clandestino Democratas de Gaula ou como director do Garajau, de que também é ardina, foi condenado a indemnizar os ofendidos e a pagar custas judiciais com parte do salário.
Salário penhorado
Até Março próximo receberá mensalmente cerca de 700 euros e a partir daquele mês, por ordem do tribunal, volta a ter penhorado, para indemnizar a juíza ofendida, um terço do seu único rendimento (o de deputado da Assembleia regional). À conta destas condenações, em Dezembro recebeu apenas 470 euros, quase metade da indemnização que lhe foi paga por um funcionário do governo regional condenado em 2006 por crime de ofensa à integridade física, depois de o ter agredido por distribuir folhetos a denunciar casos de corrupção. "Na Madeira, vive-se um clima de coacção. Estas pessoas, influenciadas pelos caciques do PSD, agridem e batem por motivos políticos. Isto tem que ser punido para restaurar o Estado de direito nesta parcela do território nacional", defende.
"Ele é boa pessoa. Amigo do povo e contra os seus opressores, por isso é atacado", diz Carmina Marujo, sua vizinha no sítio Ribeiro dos Louros, no alto de Gaula. "Se não fosse ele, não teríamos esta estrada que tanto reclamou na câmara."
Casado, com duas filhas, nasceu a 22 de Julho de 1952 na freguesia de Gaula, em Santa Cruz. É filho de Isabel Mata, ex-freira da Congregação das Irmãs Franciscanas de Nossa Senhora das Vitórias, e de José Vieira Coelho, 85 anos, membro activo da Igreja Adventista do Sétimo Dia, poeta popular que vendia pela ilha os seus livros-de-cordel (com as histórias do Assalto ao Santa Maria e O pai que matou a filha) à mistura com o Borda d"Água. 
Coelho foi baptizado na Igreja católica, herdou do pai a religião adventista e a persuasão de ardina, que lhe valeu uma viagem à antiga URSS, em 1981, como prémio de melhor vendedor do Avante!, jornal oficial do Partido Comunista Português, a que aderiu em 1977 (e do qual é ainda militante). Com o 12.º ano de escolaridade, concluído após o serviço militar cumprido em Angola, foi autarca em Santa Cruz, eleito pela Aliança Povo Unido (APU) e depois pela União Democrática Popular (UDP), e, após diferendo com a direcção regional do PCP, aceitou candidatar-se à Assembleia da Madeira pelo PND. Candidato extra-sistema, é o primeiro madeirense a disputar a Presidência da República, cargo já exercido por dois açorianos, Manuel de Arriaga e Teófilo Braga. (público)

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